Incontrolável: Contribuições para um Nihilismo Consciente

Athena: Faço unicamente aquilo que me é pedido. Peçam-me para que a cidade funcione em harmonia e unirei os escravos e engordarei os senhores. É desta forma que a harmonia se forja do caos. Todos aqueles que emigram e vivem fora da justa Athena aceitam este acordo, seja a sua ignorância sobre este acordo, sincera o falseada. Residir na minha cidade requere submissão. Tal como o boi que carrega água submete-se ao seu jugo, assim deve o cidadão da cidade submeter-se às leis da mesma. Mas caso se cansem desta situação, caso o vinho provoque doença e as uvas apodreçam na vinha, eu alegremente destruirei aquilo que me pediram para criar. Mas tenho ainda de ouvir qualquer de vós mortais, rebeldes ou reis, pedirem-me que leve a cabo esta tarefa final: deixar que o Caos reine sobre os campos de Athena. Falta-vos a coragem para ver arder tudo o que vos proporciona conforto e abrigo. Até os mais fortes de entre vós temem o poderoso Caos e o que ele fará, o qual deixarei que actue livremente. Mas lembrai-vos disto jovem alma: Faço unicamente aquilo que me é pedido. Pede-me que te construa uma cidade e farei com que funcione. Pede-me que acabe com a miséria da cidade, e só terei uma opção: destruí-la, totalmente.
—Euripides, ATHENA POLIAS (Athena da Cidade), das Peças Perdidas

Em dezembro de 2008, um grande número de jovens atenienses descobriu algo terrível. Muitos deles tinha entre 13 e 19 anos quando o jovem de 15 anos Alexis, foi alvejado no peito e morreu. Estes jovens que sabiam pouca coisa sobre assembleias anarquistas ou sobre os métodos aceitáveis de luta, rapidamente gravitaram na direcção das pessoas que eles viam queimar bancos, praticar pilhagens de lojas, rebentar bocados de mármore dos passeios das ruas, e atirar fogo contra a polícia. Durante aqueles dias ninguém tentou parar a sua raiva( a qual descobriram que tinham em excesso) excepto a polícia. Durante aqueles dias, eles sabiam quem era o inimigo: aqueles que os tentavam parar. Era evidente que a sua capacidade para destruir dependia da presença de outras pessoas, criando assim neles próprios um forte sentimento de colectividade e poder de grupo. Este poder foi utilizado contra tudo aquilo que os mantinha “em linha”, e este poder cresceu enquanto durou a insurreição. Quando esta acabou, quando regressou a normalidade, estes jovens mantiveram-se alerta e conscientes do seu poder. Agora esperam pela possibilidade de usá-lo novamente.Em Maio de 2010, três pessoas morreram dentro de uma sucursal do banco Marfin. Foram encerrados pelo seu patrão, temerosos de perder o emprego, acabando por arder quase todo o edifício consequência do lançamento de cocktails molotov para o interior. As mortes destes simples funcionários de um banco empurrou os anarquistas de Atenas para uma crise. Os meios de comunicação usaram estas mortes como uma desculpa e justificação para a repressão. A sociedade voltou-se contra os anarquistas “assassinos”. Por detrás de tudo isto, os anarquistas voltaram-se contra os anarquistas, procurando uma razão, explicação ou argumento para tão horrível acto. Na verdade não havia nada para encontrar. Alguns disseram que os incendiários eram grupos para-estatais, outros que tinha sido a própria polícia, outros afirmaram que tinha sido um acidente, e outros disseram que estas eram baixas aceitáveis numa guerra. Somente alguns dos mais lúcidos entre os anarquistas entreviram o que realmente tinha acontecido: as juventudes de 2008 tinham queimado completamente um banco que tinha sido trancado por um patrão.

Greve Geral 15 Junho 2011

Em maio de 2011, os anarquistas de Atenas estavam bem metidos num auto-declarado momento crítico. Uma das razões mais comuns foram os dias seguintes à tragédia do banco Marfin e as críticas internas que não tinham parado ao largo do ano. Outra razão foram as detenções de membros das novas guerrilhas urbanas e a quantidade de apoio necessário para presos políticos, que alcançavam já os 40. Haviam muitas críticas a algumas destas guerrilhas, especialmente à campanha de cartas-bomba levada a cabo pela Conspiração das Células de Fogo. Foi dito que estas acções eram inúteis e somente ofereciam ao Estado mais exemplos de terror anarquista para oferecer ao público. Dois anarquistas foram capturados e mais tarde admitiam o envio dessas cartas-bomba a diversas embaixadas estrangeiras. Um dos anarquistas presos tinha 22 anos, um dos jovens de 2008. Georgios Papandreou, o actual primeiro ministro grego, afirmou o seguinte sobre estes jovens descontrolados: “Estes actos irresponsáveis e covardes não conseguirão impedir os nossos enormes esforços para restabelecer a nossa credibilidade e reavivar a nossa economia.”

Estou ligada a um amigo através de alguma experiência de eleição, entendimento, ou decisão que implique que o crescimento do seu poder seja consequência do crescimento do meu próprio. Simetricamente, estou ligada a um inimigo por eleição, somente que neste caso existe um desacordo, para que o meu poder cresça, implica que o enfrente, que eu minimize a suas forças.
Virginia Wolff

A maioria do tempo estão na primeira linha, preparados para atirar uma bomba improvisada ou um cocktail molotov, caso tenham um. Geralmente não se contentam com pedras ou paus. Quando não acontece nada ou a polícia está ausente destroem o que quer que esteja em seu redor: semáforos, quiosques, pequenas lojas, qualquer coisa. Nalguma ocasião são impedidos por transeuntes e algumas vezes funciona. Recentemente alguém tentou começar um incêndio que foi prontamente apagado por outros anarquistas. Enquanto se desenvolvem assembleias em ocupações, eles estão fora a provocar a polícia, atirando pedras e preparando armadilhas. Muitos dos anarquistas simplesmente não os levam muito a sério. Alguns desprezam-nos completamente afirmando que estes jovens “não querem ter nada a ver com o movimento anarquista”. Estes jovens de 2008 identificam-se como anarquistas, mas existem muitos outros anarquistas que rapidamente dirão que não possuem “qualificação” para tal.

O ataque recente a uma esquadra em Exarchia trouxe mais críticas. durante o ataque, uma moto incendiou-se e explodiu no momento em que um vendedor de um mercado de rua próximo tentava apagar o fogo. No dia seguinte, os jornais estavam repletos de titulares dizendo que os “encapuzados” agora queimavam pessoas pobres. Esta acção levou-se a cabo num péssimo momento. Os fascistas tinham recentemente realizado uma concentração em frente do edifício do banco Marfin que tinha sido queimado um ano antes, numa tentativa de capitalizar a raiva popular e desconfiança em direcção aos anarquistas. Depois do assassinato de um cidadão Grego de esquerda, os fascistas proclamaram que os assassinos tinham sido imigrantes e rapidamente mobilizaram centenas de pessoas, preparando um pogrom racista que ainda hoje continua. O ataque à esquadra da polícia ocorreu neste período de tensão, e foi visto por alguns como uma tentativa de atacar as mesmas forças policiais que tinham estado a proteger os fascistas enquanto estes aterrorizavam o centro de Atenas. Dado o momento pouco afortunado do ferimento acidental do vendedor de rua, alguns anarquistas rapidamente condenaram o ataque. O jornal de direita Kathemerini citou alguns residentes de Exarchia que diziam que os “verdadeiros anarquistas” jamais fariam algo parecido.

Este ataque saiu desde Exarchia. Centenas de anarquistas vagueiam pela praça de Exarchia, bebendo, fumando, e conversando. Muitos dos jovens de 2008 passam as suas noites aqui. É onde informação, ideias, e iniciativas planeadas rapidamente circulam como um rastilho entre os anarquistas. Provavelmente estes jovens que param pela praça não são os mesmos que cuidam e mantêm o parque ocupado de Exarchia, mas certamente que o frequentam e defederiam-no da polícia sem hesitar.Ainda assim estes mesmos jovens que costumam estar na primeira linha de qualquer conflito são os mais desprezados de entre os anarquistas atenienses. As suas acções não são perfeitas, actuam irracionalmente e tendem a mandar à merda os planos dos próprios anarquistas.

Recentemente, enquanto anarquistas faziam a sua assembleia semanal na universidade Politécnica, estes jovens de 2008 atacaram grupos de estudantes marxistas que tinham participado recentemente nas eleições estudantis. Enquanto atacar as eleições universitárias tinha em tempos sido uma prática comum, hoje em dia deixou de sê-lo para os anarquistas, e a tradição é agora mantida somente por estes jovens. Os marxistas fecharam os portões da universidade, coisa que geralmente só se faz em defesa de ataques da polícia. Os anarquistas na assembleia precipitaram-se para o exterior para ver de onde procediam as fortes explosões e gritos, para encontrar unicamente um grande grupo de marxistas defendendo-se de outros anarquistas. Uma vez mais, a maioria disse que este ataque era ridículo, curto de vista, e fora de tempo, dado que os fascistas estavam nas ruas a atacar imigrantes. Mas os jovens selvagens que atacaram as eleições universitárias sabiam unicamente uma coisa: a democracia é uma merda.

A História é um pesadelo do qual tento acordar.
Iggy Pop

Tem-se falado muito em Atenas sobre canibalismo social; isto é, o corpo social devorando-se a si mesmo. Chulos imigrantes vendendo as suas prostitutas imigrantes a ricos homens gregos. Traficantes de heroína gregos vendendo a sua droga a toxicodependentes gregos. Os polícias de Atenas lutando entre eles. Os cidadãos atacando políticos. Os anarquistas atacado-se entre si. Os fascistas atacando anarquistas. A guerra de todos contra todos. Caos. Esta é a famosa imagem de Atenas sendo destruída por Athena, a sua deusa padroeira.

Os media e o governo têm um interesse muito claro em promover esta ideia de descomposição social; porque no final, se as coisas se tornam realmente más, será o Estado virá e restabelecerá a ordem. Pelo menos este é o guião esperado. Mas algo diferente está a passar-se aqui na Grécia. A Sociedade está realmente a cair aos pedaços, mais rapidamente do que normalmente cai em qualquer grande metrópole. Ninguém tem dinheiro, o governo está decidido a receber outro empréstimo da troika, e todos estão atentos ao problema. A forma que este problema assume é diferente dependendo de com quem fales. Os fascistas dizem que o problema são os imigrantes e os políticos de esquerda. Os políticos dizem que é a irresponsabilidade dos cidadãos que não pagam os seus impostos, recusam pagar as portagens, e recusam-se a permitir a construção de lixeiras nas suas aldeias. Os anarquistas dizem que o problema é o capitalismo e o Estado. Estas diferentes forças encontram ressonâncias diferentes às suas ideias em diferentes áreas de Atenas.

Por exemplo, no centro de Atenas, há muito crime anti-social, algum do qual vindo de imigrantes, e algum vindo de gregos pobres. Uma vez que se produziu o assassinato de um grego em pleno centro de Atenas e do qual rapidamente se sacou proveito, os fascistas encontraram muito apoio dos bairros à sua teoria de que o problema está efectivamente nos imigrantes. No mesmo bairro também existem anarquistas, a maior parte centrados em redor do centro social ocupado Villa Amalias. Uma vez iniciada a perseguição organizada, os anarquistas tornaram-se um aliado natural dos imigrantes e muitos ficaram perto de Villa Amalias, não unicamente por uma questão de protecção, mas para encontrar amigos num território hostil. Estes imigrantes, vivendo uma vida precária sob o capitalismo, foram sempre vítimas do canibalismo social e recorrem a pequenas empresas capitalistas apenas para sobreviverem. Agora que estão a ser demonizados e caçados, a sua esperança de integração no capitalismo grego é completamente destruída.

Estas forças estão a aproximar cada vez mais estes os dois colectivos, imigrantes estrangeiros e anarquistas. Ao quarto dia da perseguição organizada, os anarquistas e imigrantes tinham recuperado a área ao redor de Villa Amalias. Música e manifestos eram gritados para a rua através de uma coluna de som. A assembleia semanal de Villa Amalias é anunciada no bairro e atraiu dezenas de não-anarquistas para discutir o que fazer durante este período de tensão. As crianças jogavam à bola, famílias passeavam, e o medo que se tinha apoderado da área desapareceu. Não obstante, a alguns quarteirões de distância da okupa, a perseguição organizada continuava.

Existem alguns antagonismos que não serão reconciliados. Fascistas e polícia jamais se reconciliarão com anarquistas e imigrantes. Existem inúmeros exemplos(para além do descrito acima) de anarquistas e imigrantes, em Atenas, ultrapassando a suas hostilidades e encontrando bases comuns. Até recentemente não existiam muitos momentos de sobreposição entre os dois grupos. Agora existe outro antagonismo que aparece na primeira linha, mas este antagonismo dá-se entre anarquistas.

A Negação do que existe para benefício do futuro que não existe.
Charles Darwin

A 18 de Maio de 2011, a policia abordou duas pessoas que estavam paradas atrás duma mota no norte de Atenas. Um dos homens puxou duma arma e começou a disparar contra os agentes, acertando nos dois. Estes foram capazes de ripostar, ferindo o homem armado. O parceiro do homem armado conseguiu escapar no carro de patrulha da polícia. O carro foi encontrado mais tarde abandonado. O homem ferido foi levado para o hospital dando um nome falso. A 20 de Maio foi revelado que este homem era um estudante de 21 anos, chamado Theophilus Mavropoulos. Diz-se que ele fazia parte da Conspiração das Células do Fogo. Tinha 18 anos em Dezembro de 2008.

A Conspiração reclama ser composta por anarcho-niilistas-individualistas. Eles tem constantemente criticado a população grega por ser demasiado cobarde, passiva e cega. Eles culpam a população pela sua própria miséria, principalmente por esta ser demasiado estúpida para mudar a sua própria situação. A Conspiração é também crítica da cena anarquista tradicional e pelas limitações que impõe a si mesma ao permanecer apegada às velhas fórmulas ineficazes. Advogam a criação de pequenas células armadas informalmente federadas por toda a Grécia e no mundo, células que atacam directamente os símbolos e mecanismos do poder autoritário. Genericamente não falam firmemente ou com convicção sobre a criação de coisa alguma.

O niilismo da Conspiração é um reflexo do niilismo exaltado da juventude de 2008. Estes jovens não só viveram e testemunharam a falência do sistema capitalista mundial, como também testemunharam e fizeram parte da resistência que falhou. Há muita gente dos anos setenta que poderá dizer à juventude a forma correcta de lutar, mas para a juventude estes velhos falharam, como toda a gente. Quando estes jovens tentam expressar o seu desespero e vontade em agir, são usualmente silenciados, calados, ou ridicularizados por anarquistas que tem uma ligação mais próxima com as velhas tradições de luta. O resultado disto é que a juventude saltou fora dos centros de consciência do movimento, preferindo ficar na periferia onde são livres de agir como quiserem. Alguns deles romperam totalmente, como evidenciado pela Conspiração.

Existem algumas guerrilhas e militantes que encontram aceitação geral e admiração na cena anarquista. Os “ladroes de negro”, Luta Revolucionária, e Vassilis Palaeokostas para citar alguns. Palaeokostas é famoso internacionalmente por ser o homem que escapou da prisão de helicóptero. Estas pessoas, apesar da sua ousadia, mantiveram sempre as suas ligações teóricas com as cenas anarquistas e autónomas tradicionais. Acreditam na revolução social e no potencial infinito da população se rebelar. Apesar de partilharem em geral os mesmos objectivos com os niilistas (a destruição da ordem global e dos seus agentes), em várias ocasiões eles afastaram-se publicamente destes. As outras guerrilhas e militantes têm uma esperança e confiança na população que os niilistas não partilham. Os niilistas são os poucos que ao invocar Eurípedes pediram a Athena para destruir a cidade completamente. Mas eles estão sozinhos, têm sido separados e ignorados pela maioria dos anarquistas. No seu isolamento, os mais determinados desligaram-se completamente das suas origens e estão a ser apanhados lentamente, uma a um. Enquanto permanecem na prisão, a cidade persiste.

Nada é verdadeiro, tudo é permitido.
Hillary Clinton

O corrente niilismo da juventude não aparece do nada. É um reflexo do falhanço total tanto do capitalismo como da resistência. Muitos não vêm alternativa e não querem mais do que a completa destruição da besta e de quem a alimenta: a cidade. Expor estas perspectivas é muito difícil. Para as pessoas que querem mudança social, transformação radical, a total destruição soa tão louca como é. Dezembro de 2008 poderá ter tido a ajuda de actores conscientes que cuidadosamente seleccionaram os alvos, mas os impulsos destructivos de todos os que participaram foram de âmbito geral. Estes impulsos poderão ter sido formulados ou canalizados por diferentes ideologias quando a insurreição tinha terminado, mas no seu auge eles eram incontroláveis.

A primeira explosão do mesmo fogo que se espalhou pelo Norte de África, tal como 2008, era a emergência de algo novo. Não era anarquismo, comunismo ou democracia. Era o desejo de se ver livre de tudo. No Egipto, esse desejo foi canalizado pelos partidos democratas que assassinaram a energia, deixando o país numa ditadura militar. Na Grécia, esse desejo foi canalizado de volta para os sindicatos, os partidos e as ideologias. O que sustentou cada insurreição, o que as manteve no seu auge de cólera, foi a completa ausência de qualquer mão condutora. Tão depressa alguém tomou controlo, tão depressa alguém prometeu um amanhã melhor, esse amanhã depressa chegou, idêntico a todos os dias de antes.

Existe um medo entre os anarquistas, na Grécia e internacionalmente, de compromisso com os objectivos a que se propõem. O abismo de liberdade é aterrador. Sem a polícia, haveria guerra civil entre diferentes grupos e pareceria pior do que a luta entre anarquistas, fascistas e imigrantes que se vê hoje. Sem a cidade, a rede e a infra-estrutura, haveria fome em massa e violência. É utópico imaginar os trabalhadores a tomarem as centrais eléctricas e o sistema de abastecimentos de água, ou a população a reapropriar-se dos recursos da cidade e disponibilizá-los para melhor uso. Mas tal como a Bastilha, a cidade de Atenas manterá sempre o propósito para o qual foi construída. A Bastilha foi construída para ser uma prisão, nada mais. Atenas foi construída para abrigar os trabalhadores e os seus chefes supremos. Manteve este carácter por milhares de anos. Se o capitalismo desaparecesse, o propósito da cidade desaparecia com ele.

É atemorizador encarar este facto, e em medo a maioria recua para formas pré-existentes de luta que no final não somam mais do que aceitação resignada e derrota permanente. As mesmas formas podem ser repetidas, as mesmas cenas e rituais podem ser replicados, mas não funcionarão de repente quando nunca funcionaram. É o medo que afasta as pessoas da conclusão de que o mais importante projecto que nos foi deixado é a destruição do que o capitalismo criou. Quem quer destruir o lugar onde vive? Quem quer deslizar para o caos sem ser capaz de prometer a si mesmo e aos seus amigos que algo melhor virá? Não podem existir promessas no futuro. Todas as promessas tornam-se mentiras, o enganado torna-se o enganador, e a miséria presente continua.

Os niilistas e a nossa juventude não devem ser afastados nem conduzidos ao desespero. Eles são parte dos nossos mundos anarquistas e reflectem algo que é ao mesmo tempo novo e terrivelmente velho. Se não os ouvirmos, eles actuarão independentemente da nossa aprovação ou reconhecimento. Se tentarmos controla-los, seremos para eles nada mais do que extensões do sistema que eles querem destruir. Talvez exista mais verdade nisto do que possamos imaginar. Talvez sejamos simples cobardes, esperando a nossa vez até que os heróis perfeitos nos venham salvar, prometer um futuro melhor, agir primeiro para que depois os possamos seguir. Como anarquistas, sabemos que a destruição do capitalismo é necessária, mas agora que o capitalismo integrou tão profundamente as nossas vidas, este conhecimento é ainda mais aterrador. Recuamos para os anos oitenta e noventa, os dois mil, sempre agarrados ao pequeno pedaço da história em que nos mantivemos, sendo apanhados pela forma das ideias que não mudaram.

Eu não quero abandonar o anarquismo. De facto, eu quero que as ideias se espalhem o mais longe possível. Eu quero que as pessoas se relembrem dos métodos e tácticas daqueles que vieram antes de nós, quero que as pessoas não apenas usem esses métodos contra os nossos inimigos, mas que ao fazê-lo saibam também que não estamos a construir um mundo melhor, nem o prometemos. O anarquismo não é sobre alcançar a sociedade perfeita pondo fim à recente população escravizada, é sobre criar o mundo que queremos agora, para nós. É necessário destruir aquilo que queremos e não ter medo do que acontecerá.

Promover a destruição do capitalismo em 2011 é promover o niilismo. Destruir o capitalismo é destruir tudo o que ele criou, e honestamente esta tarefa é vista como niilista por aqueles que investiram alguma coisa neste mundo. Por isso estou a advogar um niilismo consciente, um niilismo que não é uma reacção aos anarquistas das assembleias, à demonização dos media, ou à indiferença da população. O niilismo que advogo opõem-se a todos os que querem gerir o potencial do presente, e não às pessoas que são geridas. O nosso inimigo não é a sociedade, mas sim as pessoas que mantêm e criam a sociedade.

Este niilismo consciente começa pela simples ideia de estar contra este mundo. O que vem a seguir é o compromisso de ser contra este mundo, um compromisso que se materializa na acção e não no discurso, é a parte mais difícil. Organizar em consciência a destruição de tudo, mais do que atropelar ou apontar o dedo a toda a gente, é a tarefa do niilismo consciente. Temos de perguntar a nós mesmos se queremos demorar, crescer velhos e existir com o mundo que desprezamos, ou dar um salto no abismo. Outros saltaram para o abismo e estão agora a cair. É hora de alcançar-mos os nossos jovens amigos, juntarmo-nos a eles no seu mergulho e lembrarmo-nos que não estamos sozinhos ao ter estes pensamentos loucos, niilistas.

Athena destruirá a cidade se lhe pedirmos. Na mitologia, Athena ajudou sempre aqueles que tinham uma tarefa para completar. E tal como Vassilis Palaeokostas escreveu na clandestinidade: “a sorte é do sexo feminino e zela pela ousadia”.

Texto publicado em anarchistnews.org a 23 de maio de 2011, traduzido para português pelo colectivo editorial da folha Ex Nihilo nº2

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Nicósia, Chipre: ISTO É O EXÉRCITO, UM CEMITÉRIO

Skapoula: Pancarta contra o exercito

12/07/2011 – O texto seguinte é da concentração de hoje. Impresso em 1.000 cópias e distribuído nas ruas da zona central de Nicósia e no protesto que teve lugar na Praça Eleftherias.

Na manhã de segunda-feira, 11 de Julho, uma forte explosão na base naval “Evangelos Florakis” resultou na morte de seis bombeiros, incluindo dois soldados (marinheiros), e ferindo vários outros. A explosão é o resultado da negligência criminosa das “competentes” autoridades que estavam cientes do problema. Eles preferiram nada fazer, ao que parece para evitar alguns dos custos. É claro que, tendo desencadeado uma incrível caça às bruxas contra os rebeldes, estavam demasiado ocupados para lidar com a questão menor da possibilidade de um acidente mortal a qualquer momento. Esse desprezo pela vida humana não é nada de novo neste mundo. Deparamos com ele todos os dias na escola, no exército [há ainda dois anos de serviço militar obrigatório para todos os jovens em Chipre], no trabalho – em todos o lado.

A explosão na base naval foi o resultado líquido desses conceitos, em tempos assassinos. A degradação da vida humana e da dignidade está profundamente ligada a uma concepção militarista da vida e da máquina militar.

O exército é uma instituição construída para matar, seja na guerra, nas fronteiras ou nas “missões cirúrgicas de paz” (ver Iraque, Bósnia, etc.). Não só matar pessoas, mas a imposição do, nacionalismo, da hierarquia e da disciplina rígida, que manipula e mata consciências. Como estudantes só podemos vê-la como uma continuação da lavagem cerebral levada a cabo nas escolas. Uma tentativa de nos moldar de acordo com os seus padrões, a fim de nos tornarem escravos obedientes do sistema e de qualquer poder.

Uma referência ao passado criminal do exército cipriota merece ser feita, (no mínimo, é hipócrita e contraditório pensar que só agora é negativo) pois em Chipre existe uma longa lista de suicídios de soldados (além dos problemas psicológicos causados aos soldados) e de “acidentes”, resultantes da interdependência e da cooperação com a junta militar (Grécia ’67-’73) e da participação no golpe de 74 com as suas trágicas consequências.

É semelhante o que se passa com a Guarda Nacional. Mas em Chipre existe um teatro do absurdo, já que não temos nem um nem dois, mas seis exércitos! E/K (cipriota grego), ELDYK (forças do exército grego) TOURDYK (forças do xército turco) da ONU e da NATO (bases britânicas).

Seis forças armadas numa pequena ilha! Por quê? Porque os militares são uma parte integrante de um sistema hierárquico, de imposição e de opressão, de exploração e de controle social. Em Chipre, os exércitos têm um papel muito importante na promoção e perpetuação do ódio e das divisões étnicas no interesse do poder, que lucra às custas da sociedade, sob o pretexto da questão de Chipre.

E a todos aqueles que estão a pedir demissões e a congeminarr exigências apenas podemos dizer-lhes que tal lógica é simplesmente uma maneira de manipular as reacções das pessoas e impedir as suas reivindicações ao governo. É necessário dissipar a ilusão de que uma administração diferente teria outro resultado. Não culpe apenas alguns ministros e outros “responsáveis” mas de todo o sistema do Estado e de todos os conceitos que lhe estão subjacentes. È preciso ter a percepção do que é colocar dinheiro acima da vida humana, preservar as divisões nacionais, a loucura militar e o apoio ao canibalismo incrível imposto pelas forças armadas uniformizadas em todo o mundo. A nossa única esperança reside na resistência contra qualquer máquina militar em qualquer tipo de poder, para um mundo livre, sem fronteiras, sem exércitos, sem esta repugnante desconsideração da vida humana.

NÃO SERVIR QUALQUER MÁQUINA ASSASSINA

ABAIXO TODOS OS EXÉRCITOS

P.S. Enviamos a nossa solidariedade para com os recrutas e todos aqueles que são forçados a sofrer a brutalidade e a imposição autoritária do exército. Nenhum refém nas mãos do Estado armado!

Grupo estudantil SKAPOULA (FUGA)

skapoula.espivblogs.net / skapoula@espiv.net

[retirado de contra info / texto original / em ingles]

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NOTA PÚBLICA acerca das intenções do Prefeito de Atenas em evacuar a praça Syntagma

Para o Prefeito de Atenas

Após a proposta da assembléia temática de Democracia Direta, a Assembléia Popular de Syntagma responde mais uma vez para o Prefeito de Atenas Sr. Kaminis acerca de suas declarações, suas intenções, e todos os comentários na imprensa que se referem ao plano de “evacuação” da praça. O anúncio foi o seguinte:Para o Sr. Kaminis Seguindo uma ordem do governo, você afirmou que irá esvaziar a praça Syntagma, responsabilizando-se assim pela tarefa de executar um ato inconstitucional, visto que na nossa Constituição, o artigo 11 protege categoricamente o direito dos cidadãos e das cidadãs de se reunir em assembléias. Nós queremos lembrá-lo que os espaços públicos pertencem a estes mesmos cidadãos e cidadãs. Por 45 dias o povo de Atenas (a cidade da qual você é o prefeito) está se concentrando em protestos pacíficos em espaços e praças públicas. Nós lutamos por justiça e dignidade e nós negamos obediência à leis injustas e inconstitucionais que literalmente destrói nossas vidas. Por 45 dias agora as assembléias populares botam em prática a Democracia Direta, causando interesse mundial na observação de sua aplicação, e também interesses turísticos. Ainda assim, estamos sendo ignorados abertamente por você, por 45 dias.

Ao invés de ocupar o seu lugar conosco no movimento da praça Syntagma, se apressa em consentir com as ordens governamentais contra nós. Porém, você declara, falsamente, maliciosamente, que para qualquer cancelamento de turismo e diminuição das atividades comerciais do centro da cidade, aqueles aos quais se deveria culpar seriam xs “indignadxs”! Mas você sabe (e sabe muito bem) que xs milhares que passaram, estão passando, ou permanecem em Syntagma, Gregos ou estrangeiros, não só não provocam o arrefecimento do turismo e do comércio, como os reforçam. Você não disse palavra alguma sobre as desastrosas consequências para o turismo causadas pelo terrorismo de Estado do dia 15, nem sobre a orgia química, nem sobre a violência policial contra xs manifestantes nos dias 28 e 29, não só na praça Syntagma, como também em Pagrati, Stadium, Monastiraki e Aeropageitou, etc. Nada foi dito também sobre as consequências de toda essa violência e terrorismo para a atividade comercial próxima de Syntagma e do centro de Atenas. Você não disse nada sobre o ataque das hordas do esquadrão de polícia especial “DIAS” (motociclistas com “licença para matar”) contra as vendas de Ermou, e os atos de violência ocorridos inclusive contra turistas. Você não se posicionou contra a violência das forças de repressão que agiram em peso contra os cidadãos e cidadãs da cidade e se recusou também a discutir a questão durante a audiência na câmara municipal. Nem uma palavra sobre os desastres causados pela repressão e as forças MAT do governo em relação aos espaços públicos da cidade, e especialmente da praça Syntagma. Nem mesmo sobre os milhares de químicos que a guarda de elite do Sr. Papoutsis espalhou, e cujos custos reais foram a saúde e a segurança dxs Atenienses. Você não compareceu em uma única intervenção para prevenir a violência incontrolável da polícia, que resultou em centenas de feridxs. Foi através da sorte e da nossa solidariedade que no fim do dia não haviam pessoas mortas. Você não disse nada sobre o plano organizado pela polícia de promover drogadictos para a praça Syntagma. Se algumx sem-teto ou drogadictx encontra lá o seu refúgio, é porque lá não são perseguidxs. Se a presença delxs insulta sua estética, nós o lembramos que elxs são vítimas da insensibilidade do Estado e das políticas municipais, das quais você também é responsável. Ao invés de perseguí-lxs de rua em rua e praça em praça, é o seu dever resolver os problemas delxs, dar esperança, providenciar moradia e assistência médica, para que possam reconquistar sua dignidade perdida. Não podemos nos esquecer, que a maioria daquelxs que permanecem nas tendas, acampadxs em Syntagma, é composta de pessoas que deixaram suas casas e suas vidas, para materializar efetivamente o lema da praça: “Nós não iremos, até que eles saiam”. São essas pessoas decisivas que o atual status de poder teme e insulta. Sr. Kaminis, quando a população estava em perigo, a sua ausência foi evidente, foi notória. Naqueles dias e horas críticas, Atenas não tinha um Prefeito… Deixando de lado, desta forma os pretextos, e admitindo que você está agindo sob ordens para colaborar com o plano de dissolução das assembléias populares. Você irá consentir com as sugestões de um governo injusto e violento que você serve voluntariamente até hoje, e finalmente se colocar abertamente contra os cidadãos e cidadãs da “sua” cidade? Você irá, ao invés de ser o Prefeito, desprezar a possibilidade de ser o protetor do povo e tornar-se cúmplice da violência que se arremete sobre ele? Nós não somos apenas xs “indignadxs” que a mídia insiste em afirmar como se fosse um rascunho; nós somos cidadãxs ativxs, decididos a lutar de todas as formas que decidirmos em comunidade através das nossas assembléias, até que todos aqueles que nos direcionaram a estas condições que estamos inseridos afastem-se, até que todos vão embora: o Governo, a Troika, a memoranda e as medidas de austeridade, bancos e seus representantes, etc. Até que possamos conseguir de volta nossas vidas e instalar uma democracia de igualdade, justiça e dignidade. A assembléia popular interessa a todos os cidadãxs. Você pode vir como um cidadão e expressar seus pontos de vista, como todxs.

Assembléia Popular da praça Syntagma, 10 de Julho de 2011.

[retirado de from the greek streets / tradução livre: fogogrego]

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Grupo assume ataque incendiário contra automóveis da empresa de telecomunicações OTE

O grupo anarquista grego Conspiração das Células de Fogo assumiu em comunicado na internet nesta quarta-feira (13) a autoria de um ataque incendiário contra 12 automóveis da Hellenic Telecommunications (OTE).

A ação direta aconteceu na madrugada do último domingo, num estacionamento do cruzamento das ruas Dionissis e Hadjantoniou, em Maroussi, Atenas. Os carros ficaram completamente destruídos.

ação direta: ccf x ote

[veiculado por ana – agência de notícias anarquistas]

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Halandri, norte de Atenas: Intervenção anarquista em um teatro municipal ao ar livre

Na sexta-feira à tarde, 8 de julho, camaradas da okupa Prapopoulou realizaram uma intervenção com duplo propósito durante um concerto de verão no Teatro Rematia (Evripidio), em Halandri, norte de Atenas. Uma mesa com textos de contra-informação foi colocada por aproximadamente três horas na entrada do teatro, enquanto várias pessoas foram instigadas a entrar de graça no concerto. A ação dos okupas foi bem recebida e foi possível levantar uma boa quantia de dinheiro solidariamente, embora tivessem acontecido pequenos conflitos com os organizadores do concerto e com as autoridades municipais que tentaram impedir a intervenção.

“Reapropriação do espaço público, contra a mercantilização”, “O terrorismo de Estado não passará. Apoio efetivo para os presos em 28 e 29 de junho” foram os dois principais tópicos do texto que foi distribuído e lido no microfone para o público no início do concerto. Uma faixa solidária foi desfraldada no palco.

Por um lado, os okupas da Prapopoulou expressaram sua oposição ao controle e encargos para entrar neste teatro municipal ao ar livre, localizado na paisagem natural da Rematia (“Corrente”). Eles também tomaram uma posição contra a comercialização de todos os aspectos da vida cotidiana no contexto atual de um crescente e duro ataque contra a sociedade por parte do Estado e dos capitalistas.

Por outro lado, a intervenção enfatizou a contra-informação acerca dos incidentes brutais de repressão durante a greve geral de 48 horas nos dias 28 e 29 de junho. Os okupas informaram às pessoas sobre as penalidades extorsivas que foram impostas aos manifestantes presos. Circularam caixas para apoio financeiro, a fim de obter a quantia das fianças. Eles também falaram sobre a necessidade de uma solidariedade concreta com os que estão resistindo nas ruas e praças.

[retirado do contra info / tradução ana – agência de notícias anarquistas]

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Veria: Carro particular de MP (Membro do Parlamento)… atolado em merda

carro coberto por fezes

Em Veria, norte da Grécia, uma ação direta de grande inspiração – atribuida a residentes da cidade – aconteceu contra um MP do PASOK da prefeitura de Imathia, chamado Thanassis Gikonoglou. Desconhecidxs, provavelmente “indignadxs”, jogaram excremento por todo o carro particular do MP. Desta maneira, ao invés de sua pessoa, sua imagem pública é que foi danificada – aparentemente ele estava dormindo no momento do incidente. O carro foi literalmente banhado em bosta fresca.

Em grego: indymedia atenas

Em inglês: contra info

Tradução livre: FogoGrego

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Grécia, entre a raiva e a resistência

[retirado do cmi-brasil]

Grécia, entre a raiva e a resistência
Por Elpida Niku, de Desinformémonos

Assim que foram aprovadas as medidas orçamentárias, o povo saiu às ruas: “Nunca tínhamos visto isso. A partir de hoje estão em guerra com o povo grego, o senhor presidente está no lixo da história”.

Foto por Elpida Niku.

Atenas, Grécia. O ano de 2010 na Grécia foi de plena incerteza. Depois de ganhar as eleições em outubro de 2009, o primeiro ministro Giorgos Papandreu anunciou que “sim, havia dinheiro” para que a economia grega seguisse normalmente. Alguns meses depois decidiu que não havia, e que o país teria de solicitar ajuda financeiro ao FMI e à União Européia. Durante todo esse tempo, os políticos apareceram nas telas dos principais meios de comunicação para comentar o tema: se havia ou não dinheiro, se a economia colapsaria ou não, se havia necessidade de pedir empréstimos para seguir pagando as dívidas.

A população grega se encontrava aterrorizada. Enquanto os políticos falavam de números incompreensíveis, as pessoas se perguntavam o que tudo isso significaria para sua vida diária, sem entender a quem deviam e por quê. Até que chegou o momento em que decidiram se mobilizar. Foi lançada uma convocatória anônima por meio das redes sociais da internet para que os habitantes saíssem às ruas e se reunissem na praça central de Atenas em Sintagma, onde se localiza o parlamento grego.

Assim, na tarde do dia 25 de maio a população começou a se encontrar na frente do parlamento do país. Foi impressionante a quantidade de pessoas que chegavam. A partir desse dia, os gregos se reúnem na frente do parlamento todas as tardes. Ali permanecem por horas, fazendo soar o barulho das colheres nas panelas, carregando nas mãos bandeiras gregas e de outros países, assobiando, gritando palavras de ordem espontâneas incessantemente. O clima é festivo. Não se trata de queixar-se, ou pedir algo; se trata de manifestar um enorme e decisivo descontentamento. “Nunca mais farão decisões sem nós”. Trata se de um estamos aqui e não estamos de acordo. “Não estamos de acordo em viver numa falsa democracia, onde aqueles que decidem a respeito de nossas vidas o façam sem nossa presença”, comentavam as pessoas entre si.

E assim seguiu a situação por mais de um mês, e o governo se viu obrigado a anunciar mudanças no seu gabinete. Ao mesmo tempo, estabeleceu uma data na qual aprovaria as novas medidas de austeridade, que consistem em um aumento de impostos para a maioria dos gregos, privatizações de empresas estatais e cortes sociais fatais para uma população já pressionada, que sofre por alto nível de desemprego e vive um futuro incerto. ?Poderíamos suportar muito sofrimento se contássemos com alguma perspectiva para o futuro?, conta um dos manifestantes. “Mas com essas medidas não há futuro. Não há futuro para nós nem para nossos filhos”.

A data anunciada para a aprovação das medidas foi dia 29 de junho. A assembléia popular da praça de Sintagma, que acontece todos os dias às 21h com participação do povo, decidiu estar presente nas ruas nesse dia e no anterior, pressionando para que as medidas anti-sociais não fossem aprovadas. Também os sindicatos oficiais, pressionados por suas bases, anunciaram greve geral de 48h para esses dias.

O dia 29 de junho amanheceu bonito. Viam-se dezenas de pessoas se juntarem em três pontos de encontro que haviam sido estipulados na assembleia para cercar o Parlamento e impedir que os deputados entrassem no edifício. A brutalidade policial se deflagrou desde cedo, quando foram feitas as barricadas nas ruas principais para fechar o caminho dos parlamentares. Os policiais reprimiram os manifestantes violentamente, atirando bombas de gás lacrimogêneo e batendo com os cassetetes.

Ao mesmo tempo, as pessoas se concentravam na praça Sintagma. Os microfones anunciavam a chegada dos ônibus procedentes de diferentes cidades do país carregados de pessoas que vinham para protestar contra as medidas de austeridade. Os manifestantes entravam na praça carregando cartazes, batendo palmas, gritando palavras de ordem, para depois se juntarem em frente ao Parlamento. As estações de metrô também se encontravam abarrotadas de pessoas de diferentes bairros de Atenas que vinham para se juntar- ao protesto.

Enquanto isso, dentro do Parlamento se iniciou a discussão sobre as novas medidas. A população ateniense protestava pacificamente no centro da cidade. Por volta das 14h a polícia começou a atacar sem precedentes. Com uma quantidade imensa de lacrimogêneos, cujo uso legal é restrito a condições de guerra, o corpo policial dispersava a população que se manifestava. Os cassetetes policiais golpeavam indiscriminadamente idosos, mulheres e crianças, deixando um saldo de pelo menos 500 pessoas feridas. Quebraram pernas, cortaram cabeças e causaram dificuldades respiratórias na grande maioria dos que ali se manifestavam. Chegaram a jogar gás lacrimogêneo dentro das estações de metrô do centro da cidade, onde as pessoas justamente buscavam refúgio dos gases da praça e onde também um grupo de médicos socorria os feridos. Ainda que muitos manifestantes tivessem comparecido já preparados com máscaras e panos para se protegerem das armas policiais, a quantidade com o qual foram atacados supera a imaginação de qualquer um. O centro de Atenas foi cenário de guerra por mais de 12 horas, durante as quais uma nuvem de gases cobriu o céu, que permaneceu cinza por horas.

Ao mesmo tempo, um grupo de jovens emputecidos desprendia o pavimento das ruas próximas à praça e atiravam pedras contra a polícia. Alguns manifestantes se aproximavam desses jovens para explicar que o que faziam, longe de ajudar, dava pretextos para a polícia continuar atacando. Muitos ouviram o pedido e pararam. No entanto, existem vídeos que mostram “manifestantes” vestidos de negro, como esses rapazes, saindo ou entrando nas filas policiais.

O que se tentou fazer foi provocar medo na população para que essa não saísse às ruas. Mas a brutal repressão causou o efeito contrário. A indignação frente à brutalidade policial fez com que depois de cada ataque as pessoas voltassem ao lugar de protesto com mais força que antes. Muitas vezes, os manifestantes revoltavam-se tanto pelo comportamento dos policiais que se juntavam e, sem outra arma que sua própria voz, os forçava a retroceder. A solidariedade entre os participantes foi impressionante. Se alguém não conseguia respirar ou enxergar, sempre era auxiliada por alguém. Havia muitas pessoas circulando pelo centro da cidade carregando e distribuindo um líquido que alivia os sintomas produzidos pelos gases. Mãos dispostas a ajudar carregavam as pessoas que já não podiam mais se mover. E cada vez que se ouviam os disparos das bombas as pessoas batiam palma cada vez mais forte, incentivando a resistência.

Assim se passaram quase três horas, até o momento em que começou a correr o boato de que as medidas haviam sido aprovadas, com 155 dos 300 deputados votando a favor. “Já sabíamos que votariam assim”, comentou uma mulher de 50 anos que estava nas ruas desde manhã.

“Estamos lutando por uma gloriosa derrota, por nossa dignidade. Falam-nos na TV sobre os moleques que jogam pedra e sei lá mais o quê. Pois na verdade agora que queimem tudo, já que nada é nosso mesmo”.

“Hoje vivemos uma guerra”, comenta sua companheira que descansa um pouco ao seu lado, esgotada já de tantos gases. “Nunca tínhamos visto isso. A partir de hoje estão em guerra com o povo grego, o senhor presidente está no lixo da história”.

Depois de tantas horas de repressão, a polícia optou por terminar de uma vez por todas com o protesto. Um grupo especial de policiais que andava de motos tomou as ruas centrais da cidade. Eram cerca de 50 motos por vez, avançando em uma velocidade assassina pelas ruas cheias de gente. Enquanto corriam atiravam gás lacrimogêneo contra as pessoas que estavam no caminho e espancavam com cassetetes àqueles que não saíam de sua frente. Chegaram a lançar gases nas ruas turísticas da cidade, onde pessoas comiam em restaurantes e turistas passeavam.

“Eu vi eles passando várias vezes por aqui, debaixo da minha casa, batendo nas pessoas”, conta uma das manifestantes que vive próxima à praça de Sintagma. “Aterrorizam o mundo inteiro, são brutos. Da minha varanda eu atirei panelas neles. Faz um mês que eu estou nas ruas, na praça, e o que eles estão fazendo é inconcebível. Mas não vamos parar. Estava pior quando ficávamos em nossas casas agüentando mudos tudo o que eles estão fazendo”.

Ainda assim as pessoas não se retiraram e seguiram resistindo, voltando incessantemente à praça até que, por volta das 23h, dezenas de policiais cercaram a praça Sintagma, proibindo que os presentes permanecessem em frente ao Parlamento. Muita gente ficou em frente às fileiras de policiais por horas, questionando “por que não nos deixam passar?”. Durante as primeiras horas do dia seguinte, a polícia se retirou e a população regressou à praça. Pouco a pouco limparam as ruas e a praça, recolheram pedras, garrafas de gás, tendas destruídas. O acampamento foi armado de novo para receber as pessoas que dia 30 de junho se juntavam ali de novo.

30 de junho: “Ao invés de nos debilitar, nos fizeram mais fortes”

No dia seguinte da repressão brutal que a polícia grega desencadeou contra o povo grego, o centro de Atenas se encheu de gente mais uma vez. Milhares de pessoas saíram de novo para denunciar o comportamento policial do dia anterior. Desta vez, a raiva do povo se sentia no ambiente e dava calafrios. Durante horas as pessoas permaneceram paradas em frente às fileiras policiais que protegiam o Parlamento, falando com eles, lhes insultando, pedindo que renunciassem.

Um jovem revoltadíssimo lhes atira uma garrafa de água. Alguns manifestantes pedem para que pare. Outros o defendem dizendo: “Não, já superaram nossos limites, são uns brutos e não entendem nada. Eu não estou encapuzado, tenho dois filhos e o que fizeram ontem é imperdoável, se portaram como cães ferozes”. Por lá estava também um padre, descontrolado, que gritava especificamente com um policial: “Eu te conheço, ontem você mandou meu filho para o hospital, você é meu vizinho, sei onde você mora e onde é a escola dos seus filhos”.

“O que vão dizer aos seus filhos amanhã quando perguntarem em que trabalha o pai? Vão ter de dizer que estão matando a população. Como conseguem dormir à noite?”, gritava outro manifestante. E seu companheiro complementava: “Ontem vocês falavam que iam foder com a gente, que não temos trabalho e que por isso estamos nas ruas. Quero ver quando vocês estiverem sem trabalho, quem vai estar do lado de vocês?”

Na praça, abaixo, já estavam montadas as tendas e as mesinhas dos diferentes postos de trabalho e também se viam dezenas de garrafas de gás lacrimogêneo que as pessoas recolheram e penduraram em diferentes partes da praça. Como todas as noites desde o dia 25 de maio, a assembleia popular começou às 21h. O assunto da discussão era o rechaço à repressão estatal e à classe política e pela democracia direta. “O que aconteceu ontem foi a destruição total da democracia, a destruição de um sistema no qual o povo manda. Todos eles, ali no Parlamento, deveriam abrir um dicionário. Mas é que não havia outra maneira de voltar as medidas, só assim, afogando nossas vozes por horas com gás lacrimogêneo. Mas o que não sabiam é que ao invés de nos debilitar, nos fariam mais fortes”, disse uma senhora.

Nessa assembleia se escutaram mensagens de solidariedade da Islândia, Egito e Argentina, alimentando o ânimo para a continuidade da resistência. O clima era festivo. As pessoas aplaudiam sem parar, com cada vez mais força. “Nós, tontos que somos, votávamos por eles até agora, mas chega, esse movimento é nossa vida, nosso futuro, não vamos sair até que eles se vão”.

Tradução de Gabriela Moncau

Site do Desinformémonos:  http://desinformemonos.org/

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Petralona, Atenas: Manifestação em solidariedade com xs detidxs de 28-29 de Junho

passeata

Na terça, 5 de Julho, uma manifestação de mais de 150 pessoas, em solidariedade com xs detidxs durante as manifestações da greve geral de 28-29 Junho ocorreu em Petralona, perto do centro de Atenas.

A manifestação foi convocada pela assembleia popular dos bairros Petralona-Koukaki-Thissio.

Residentes desfilaram pelas ruas, muitos vindos de Ano Petralona/ Kato Petralona (o distrito está dividido em dois bairros pela linha de metro). Foram cantados diversos slogans de luta, tais como:

– Todos para as ruas e praças – Assembleias populares em cada bairro

– Se não resistirmos em todos os bairros, as cidades em que vivemos vão se tornar as novas prisões

– Socos e chutes em cada juiz – Justiça é uma questão de classe

– A solidariedade é a arma do povo – Guerra contra a “guerra dos patroes”

– Nem em Petralona nem em qualquer lugar – Esmagar os fascistas em cada bairro

– Povo, arma-te – Agora ou nunca

pixos

Quando a manifestação atingiu as instalações locais do partido no poder, o PASOK, na Rua Ious, xs manifestantes escreveram palavras de ordem na fachada e assinaram com graffiti. Um grupo multi-étnico de jovens com bicicletas e skates lideraram a volta a volta.

Uma assembleia popular realizou-se posteriormente, na noite de quinta-feira, 7 de Julho, junto à estação do metro de Petralona (do lado da rua pedonal de Kato Petralona).

fontes: sinoikiesfilopappou.wordpress.com, athens.indymedia.org

[retirado de contra info]

 

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Assembleia da Praça Syntagma ameaça investidores

ADVERTÊNCIA À TRÓIKA, BANCOS E POTENCIAIS INVESTIDORES LOCAIS E ESTRANGEIROS QUE SONHEM COM O PATRIMÔNIO PÚBLICO DA GRÉCIA.

Um governo grego ditatorial e decadente, não reprensentante do povo deste país, acaba de votar em um projeto de lei que tem como objetivo a venda de território e de patrimônio público gregos, contra a vontade de grande parte da população.

Informamos a todos os que vêm com isso uma oportunidade de investimento, que não tardaremos em derrubar este governo, que em breve terá que prestar contas por seus crimes contra o povo e o país. Suas assinaturas e seus projetos de lei são inválidos pois não passaram pela aprovação do povo grego, e portanto não os reconhecem.

Advertimos a cada potencial investidor que não cogitem a idéia de leiloar nosso patrimônio e território públicos, e muito menos comprá-los. Além de perderem seu dinheiro quando nós, como povo, recuperarmos a soberania deste país, o dinheiro que terá sido envolvido na transação ilegal não será reembolsado.

Além disso, advertimos que até recuperarmos o controle do país, no âmbito de defesa de nossos direitos, como previsto pela Consituição grega e também pelos direitos internacionalmente reconhecidos dos povos e dos seres humanos, faremos o que for necessário através de nossa auto-organização para cancelarmos estas ações, e sabotarmos seus eventuais investimentos.

Portanto, que nenhum potencial investidor ouse utilizar a ocasião como oportunidade de compras do patrimônio e território gregos, exceto se tiver conhecimento do alto risco de seu investimento. Neste caso, seu investimento “será bem-vindo” num país onde quando a liberdade do povo é roubada, sabe dar a volta por cima, como já visto em ocasiões históricas anteriores.

Assembléia Popular de Syntagma, 03-07-2011

[retirado do cmi-brasil]

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Grupos assumem incêndio a carro de prefeito de Papagou

Comunicado:

Para começar, sobre os acontecimentos de 28 e 29 de junho [Greve Geral de 48 horas na Grécia], acreditamos que algumas questões precisam ser ditas. Nós não entramos na lógica dos falsos dilemas que o Estado coloca como o voto ou não do memorando [do FMI e da União Européia] a médio prazo. Em qualquer caso, a democracia, mais cedo ou mais tarde, mostra a sua cara dominante na guerra real, que não começou agora, nem sequer recentemente. Caminhamos junto aos indivíduos ou grupos que perceberam a situação deste momento específico e que atuam mais agressivamente do que o habitual. No entanto, a estagnação e a repetição levam à monotonia, enquanto a freqüência e o progresso da prática agressiva estão contribuindo para causar feridas mais graves para o inimigo. Finalmente, para aqueles que simplesmente se limitam a levantar o dedo médio, dizemos simplesmente que o nosso tempo é mais importante. No sentido de progresso apostamos na ameaça pessoal. Sabemos e mostramos que o nosso inimigo não é um conceito vago de prova de fogo, mas tem uma substância material, real, rua e número, nome e dados financeiros. Assim fizemos uma “visita” ao carro do prefeito da zona de Papagou.

Nas primeiras horas da segunda-feira (4 de julho), nos aproximamos do objetivo e colocamos no pneu do veículo um dispositivo incendiário simples, consistindo de 1 litro e meio de gasolina e velas de um tamanho adequado, para assegurar o tempo necessário para fugir da área; essa escolha aconteceu para que não aparecesse acidental. É uma área ocupada pela polícia de segurança, e por esta razão, é especialmente agradável ver o veículo pessoal do governante local queimado. O mesmo, naturalmente, vale para todos os prefeitos, de todas as áreas.

Carro do prefeito de Papagou.

E agora, entre o dito acima, uma referência pessoal. Sr. V. Xidi, hoje é seu carro, amanhã sua casa, depois de amanhã é você. Enquanto alguns são eleitos para governar, alguns escolhemos para exterminá-los. Enquanto houver uma classe dominante, haverá revolucionários. Nós prometemos que, enquanto vivermos, vocês não vão dormir em paz.

O carro inteiro na bunda dos prefeitos!

PS: Um sinal incendiário a todos os grupos de guerrilha… Vamos que vamos.

Frente Revolucionária Internacional

Conspiração das Células de Fogo

Grupos revolucionários para a difusão do terror

Células de Hereges Anormais

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[notícia veiculada por: agência de notícias anarquistas – ana]

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