Há momentos em que as palavras perdem seu significado. Momentos estranhos, em que nem mesmo a junta decadente é capaz de encapsular o que está acontecendo de fato: afinal, apesar de todo o seu totalitarismo, os regimes militares dos anos 70 nunca poderiam ter atingido nem o nível de sofisticação nem o tamanho da operação de controle urbano ocorrida ontem, em Atenas. O que aconteceu efetivamente, não foi simplesmente um ataque da polícia contra a manifestação, mas sim, uma ofensiva destes contra uma cidade inteira – um urbanicídio de gravidade extrema. Nós estávamos lá, na estação de metrô transformada em abrigo para as milhares de pessoas que protestavam na praça Syntagma, onde a polícia anti-motim havia bloqueado a iluminação proveniente da porta de entrada, mas não deixamos de entoar nossos cânticos, e através deles, fizemos vibrar todas as paredes do subterrâneo. Nós estávamos lá, no limite oeste da Syntagma, onde a onda de parasitas criminosos dos motociclistas da polícia Delta varreram as ruas estreitas da praça, de Ermou, de Mitropoleos… Nós estávamos lá, sendo perseguidxs, agredidxs pelos assassinos uniformizados que não só agrediam, como também detinham as pessoas em restaurantes, expulsando-as, esmagando a tudo e a todos. Em tempos como estes, as palavras perdem seu significado – mas não sem fulgurosas exceções. A solidariedade é uma delas. Estava estampada no centro médico improvisado na praça Syntagma. No rosto dxs donxs da cafeteria, trabalhadorxs que nos forneceram abrigo. Na vontade de pessoas aleatórias em ajudar os feridos sob imenso risco pessoal. Na determinação dos milhares que reconquistaram Syntagma mais tarde durante a noite. Em tempos como estes, o monstro do poder se torna canibal, capturando cidades inteiras em sua sede de sangue. Em tempos como estes, o monstro nos quer amedrontadxs, feridxs, humilhadxs na escuridão da esfera privada.
Em tempos como estes, permanecer nas ruas se torna literalmente uma batalha de vida e morte. Nós permaneceremos, e não arredaremos o pé, até vencer esta batalha – não tenha dúvidas disso.
Publicado originalmente em From The Greek Streets.
Tradução: FogoGrego